Parece que está inscrito na sociedade que precisamos desfrutar da nossa vida ao máximo e retirar o maior prazer possível do nosso corpo, tornando-o como um objeto para satisfação pessoal. Com esta mentalidade acabamos por colocar como meta da nossa vida a felicidade, o prazer, o poder, esquecendo-nos do essencial, de quem somos e da razão para a qual fomos criados: o amor. Dito isto, até parece que o corpo é algo mau e que o prazer é negativo e devemos ter pudor e restrições na forma de falar e ver o corpo e a sua sexualidade. Mas não, é bem o contrário, como vamos ver de seguida.
Temos vindo a refletir sobre as catequeses do nosso querido S. João Paulo II[1], que compõem a Teologia do Corpo (TOB[2]), e que nos falam da razão da nossa existência, como Deus nos criou para o amor, logo somos livres, bem como, o facto de que, através da sexualidade humana, a minha masculinidade ou feminilidade, sou um dom para o outro.
Perante isto (sou um dom), só posso afirmar que o meu corpo é bom. Esta, para mim, foi a grande novidade da teologia do corpo, perceber que afinal a sexualidade é boa, bela e, visto termos sido criados para viver o amor esponsal, também a relação sexual, no leito matrimonial, é algo bom e belo, mais ainda, aí cooperamos com Deus na criação.
S. João Paulo II vem dar-nos a novidade de que os desejos e impulsos sexuais não são só um instinto biológico, como nos animais, que nos impelem para o prazer, mas que a sexualidade humana leva o homem a uma profunda comunhão, um desejo de amar e ser amado. Esta comunhão está interligada ao amor em movimento da Santíssima Trindade, onde se observa o Amor do Pai pelo Filho, do Filho pelo Pai, numa unidade íntima de amor, concretizada pelo Espírito Santo. Essa sede de amor foi inscrita, por Deus, nos nossos corações, portanto, só o Amor pode-nos saciar e dar sentido a toda a nossa vida. Neste sentido, a TOB, refere que os desejos sexuais são o que impulsiona o homem a sair do seu comodismo e o impele ao amor, ao dom sincero de si. Em contrapartida, o pecado, que entrou no mundo, conduz o homem ao desejo de possuir o outro, de o ver como um objeto de prazer e não ao dom de si.
A TOB vem recordar-nos que o nosso corpo é bom, santo e é templo do próprio Deus (1Cor 3, 16). É através do nosso corpo que podemos amar, viver a doação e entrega ao outro. O saudoso Papa refere “O corpo, de facto, e só ele, é capaz de tornar visível o que é invisível: o espiritual e o divino. Foi criado para transferir para a realidade visível do mundo o mistério oculto desde a eternidade em Deus e, assim ser sinal d’Ele.” (TdC 19,4)
Na verdade, no princípio, quando Deus sonhou e criou tudo, Ele estava satisfeito com a Sua criação e fez o homem e a mulher para serem dom um do outro, livres e sem pudor. No princípio eles estavam nus e não sentiam vergonha, porque eles viviam a beleza e a pureza do amor divino, eram um dom um para o outro e a concupiscência ainda não tinha entrado no coração humano. O homem e a mulher olhavam-se e viam, através da lente de Deus, os seus corpos puros e como dom um para o outro.
A ‘nudez originária’ exprime a verdadeira capacidade do homem e mulher serem dom um para o outro, de viverem em plena comunhão. Interessante ver que nada escondiam um do outro, eram livres, puros e inteiros um para o outro. Contudo, no momento em que pecam, apercebem-se, de imediato, que estavam nus. Pela primeira vez, homem e mulher sentem vergonha. Porquê? É que, no momento em que se decidem pela desobediência, eles saem do estado de graça em que viviam e o medo entra no seu coração. Medo de não ser visto como pessoa, como dom, de ser usado, possuído pelo outro como um simples objeto de prazer. Aqui entrou a concupiscência no coração humano e não conseguiram mais ver-se como Deus os via.
A “vergonha original” transformou a beleza e pureza do corpo, desvirtuou a masculinidade e feminilidade, que afastou homem e mulher da comunhão inicial, portanto de Deus. A perda da pureza atacou a sexualidade humana. Atualmente, o que podemos fazer para resgatar a beleza e pureza do corpo? Claro, não conseguimos chegar ao estado de ‘nudez original’, mas podemos resguardar o nosso corpo, preservá-lo da cobiça, do olhar malicioso, da luxúria, tendo em conta o nosso vestir, andar, comportamentos, gestos. Isto não é repressão, mas cuidado, é um resgate da nossa dignidade de filhos de Deus.
Compreendemos, então, como a Teologia do Corpo é a resposta para esta sociedade supersexualizada e erotizada, onde tudo vale para obter prazer e como se justifica o uso do outro e do corpo do outro para prazer pessoal. Constatamos, a beleza da Teologia do Corpo, visto que, afinal, não nos vem reprimir, dizer que o corpo é mau, pecaminoso e que não podemos ter prazer, nem falar dele, mas muito pelo contrário, precisamos resgatar a pureza original e do sentido da vida matrimonial, como vocação bela e desejada por Deus, que é caminho de santificação.
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